
Novas Regras para o Divórcio: O que você precisa saber
**I - INTRODUÇÃO**
O divórcio é um marco no Direito de Família brasileiro. Após a Emenda Constitucional n.º 66/2010, consolidou-se como um direito potestativo, imediato, sem necessidade de prévia separação judicial ou requisito temporal. A partir de então, o ordenamento avançou em direção à desburocratização e à liberdade individual, incorporando mecanismos extrajudiciais, registros eletrônicos e, mais recentemente, uma importante decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que autorizou o chamado divórcio unilateral judicial liminar.
Assim, a compreensão do divórcio contemporâneo exige a análise da base constitucional, do Código Civil, da via judicial e extrajudicial, da revolução digital trazida pelo e-Notariado e do alcance efetivo da recente jurisprudência do STJ.
II - BASE CONSTITUCIONAL E CIVIL
A Constituição Federal, no art. 226, §6º, após a EC 66/2010, prevê de forma clara: "O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio." Essa redação elimina condicionantes e reforça que o divórcio é manifestação exclusiva da vontade individual.
No plano infraconstitucional, o Código Civil disciplina a dissolução da sociedade conjugal nos arts. 1.571 a 1.582, tratando de temas como sobrenome (art. 1.571, §2º; art. 1.578), guarda (arts. 1.583 e 1.584) e alimentos (art. 1.694). A tônica é a preservação da autonomia privada e da dignidade da pessoa humana, valores consagrados também pelo art. 1º, III, da CF.
III - O DIVÓRCIO JUDICIAL: CONSENSUAL, LITIGIOSO E A INOVAÇÃO DO STJ
III.1 - CONSENSUAL E LITIGIOSO
O divórcio judicial ocorre quando há filhos menores/incapazes ou ausência de consenso entre os cônjuges. Pode ser consensual (quando há acordo) ou litigioso (quando há divergência).
O STJ já consolidava a orientação de que o juiz pode decretar o divórcio imediatamente, independentemente da resolução de partilha, guarda ou alimentos, que ficam para fases posteriores. Esse entendimento reforça a ideia do divórcio como direito potestativo.
III.2 - O DIVÓRCIO UNILATERAL JUDICIAL LIMINAR (RESP 2.189.143/SP, 2025)
O grande avanço veio com o julgamento do REsp 2.189.143/SP (3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18/03/2025). O STJ firmou que:
- O juiz pode decretar o divórcio liminarmente, logo no início da ação, bastando a manifestação de vontade de um dos cônjuges;
- Não há necessidade de aguardar contestação ou audiência;
- As demais questões (guarda, alimentos, partilha) ficam para análise posterior;
- Fundamentação: direito potestativo (EC 66/2010) e possibilidade de julgamento parcial de mérito (arts. 355 e 356, CPC).
Portanto, o divórcio unilateral judicial liminar é plenamente admitido: basta a vontade de um dos cônjuges, sem necessidade de concordância da outra parte. Trata-se de medida que garante efetividade e evita que o estado civil seja artificialmente mantido contra a vontade de quem deseja se divorciar.
IV - O DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL: A VIA NOTARIAL
A Lei 11.441/2007, atualmente reproduzida no art. 733 do CPC, instituiu o divórcio por escritura pública em cartório de notas. Ele é admitido quando:
- Há consenso entre os cônjuges;
- Não há filhos menores ou incapazes;
- As partes estão assistidas por advogado.
Essa modalidade trouxe celeridade e desafogou o Judiciário. Contudo, a exigência de consenso permanece absoluta.
IV.1 - A IMPOSSIBILIDADE DO DIVÓRCIO UNILATERAL EXTRAJUDICIAL
Aqui está o ponto crucial: apesar do julgamento do STJ em 2025, o divórcio extrajudicial unilateral em cartório continua vedado. O CNJ já se manifestou contra a prática, e projetos legislativos sobre o tema ainda não foram aprovados. Assim, a vontade de apenas um dos cônjuges só pode dissolver o casamento pela via judicial, nunca diretamente em cartório.
IV.2 - A REVOLUÇÃO DIGITAL: E-NOTARIADO E REGISTROS ELETRÔNICOS
O Provimento 100/2020 do CNJ, consolidado pelo Provimento 149/2023, instituiu o e-Notariado, permitindo lavratura de escrituras de divórcio em meio digital, com videoconferência e assinatura eletrônica notarizada.
Complementarmente, a Lei 14.382/2022 criou o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP), modernizando a comunicação entre cartórios. Hoje, uma escritura de divórcio pode ser comunicada eletronicamente ao Registro Civil, ao Registro de Imóveis e outros órgãos, acelerando os efeitos patrimoniais e pessoais.
Essa infraestrutura tecnológica reforça a celeridade do divórcio consensual, mas sem alterar os requisitos de fundo: continua sendo necessário o consenso e a inexistência de filhos incapazes.
V - EFEITOS JURÍDICOS DO DIVÓRCIO
Os efeitos do divórcio se irradiam em três planos:
- **Pessoal:** alteração imediata do estado civil; manutenção ou não do sobrenome do cônjuge (art.
- 571, §2º, CC).
- **Parental:** aplicação da guarda compartilhada como regra (Lei
- 058/2014); possibilidade de definição posterior sem impedir a decretação do divórcio.
- **Patrimonial:** partilha pode ocorrer no mesmo processo ou ser postergada; alimentos entre ex-cônjuges são possíveis, mas de caráter excepcional e transitório (art.
- 694, CC).
VI - JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA
- STF, ADI 4277 (2017): não há necessidade de separação judicial ou prazo para divórcio.
- STJ, REsp 1.733.560/SP (2018): divórcio pode ser decretado independentemente da partilha.
- STJ, REsp 2.189.143/SP (2025): divórcio unilateral judicial liminar autorizado, basta a vontade de um dos cônjuges.
VII - CONCLUSÃO
O panorama atual do divórcio no Brasil é marcado por três grandes eixos:
- **Liberdade e autonomia:** o divórcio é direito potestativo, não depende de causa, prazo ou justificativa.
- **Celeridade:** pode ser realizado em cartório, em formato digital (quando consensual), ou decretado liminarmente em juízo, de forma unilateral.
- **Limites:** o divórcio unilateral é possível apenas judicialmente; no âmbito extrajudicial, continua sendo indispensável o consenso entre as partes.
Assim, o ordenamento brasileiro equilibra a liberdade individual de dissolução do vínculo conjugal com a proteção do contraditório e da segurança jurídica, permitindo ao cidadão que não mais deseja permanecer casado obter a dissolução de forma célere e eficaz, sem abrir mão da proteção de interesses sensíveis, como os dos filhos e do patrimônio comum.
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